domingo, 15 de março de 2015

Cidade das vaidades

Em 15/03/2015:

Os que me conhecem sabem da minha posição crítica quanto às ingerências dos governos políticos que assumem e assumiram o poder em nosso País. Estas ingerências administrativas, econômicas e políticas afetam diretamente o espaço urbano, palco da própria atuação política de uma sociedade democrática. 

A polis é o espaço histórico da voz pública, do cidadão se expressar, na origem do termo grego. Ao mesmo tempo, pelo legado histórico romano, é a reunião dos cives que constroem a civitas (CACCIARI, 2009, p. 10). A cidade, por fim, nestas primeiras décadas do séc. XXI foi retomada como lugar das manifestações públicas da população, de cidadãos comuns ao invés de grupos específicos, segmentos ligados lutas sociais, trabalhistas, ideológicas, etc. 

A falta de representatividade perante os governos, o poder legitimado pelo voto, vem criando nestes últimos anos uma sociedade descolada da política, que absorta no seu dia a dia, abre mão de seu poder de vigília e de conscientização em seu papel na democracia. Rompantes de democracia, de legitimação popular vêm acontecendo sem rumos e discursos definidos; em posições ditas políticas limitadas à ocupação dos espaços públicos por manifestações "espontâneas", seja qual for o direcionamento político que domine estas vozes, ou, como mais recentemente, o cartaz que cada um carrega como sua cruz pessoal, que precisa ser apresentada e, de alguma forma, resolvida pelo poder vigente. Na mesma medida em que o poder contemporâneo se fragmenta ao longo da extensa burocracia, a representatividade e o poder de decisão popular também se fragmentam nas extensas e conectadas redes sociais, que vêm mobilizando milhares, seja para um "flah mob" ou para manifestações contra governos, políticos, a economia, o problema de minha rua... Manifestações tão instantâneas como são suas criações e, tão turvas em seu discurso (se é que há algum) como são seus criadores em sua origem política. 

Prenuncia-se, há muito, que as redes são os novos fóruns e ágoras, os lugares de encontro dos cidadãos, que culminam, quando da necessidade, no espaço público real. Mas esquecem-se (ou nunca souberam ou procuraram saber) que nesses espaços, o debate era objetivo e direto, onde a retórica, em forma de oratória era o meio de se defender as ideias. O debate se escasseou ao ser trocado pelas convocatórias on-line para ocupar as ruas; a ponderação, sobre a qual discutia há pouco com um colega, não é mais posta como suporte à discussão. Ir à rua, mostrar minha cara e indignação é a forma política de me expressar, seja lá o que dê isso no final. 

A polarização política que assumiu o Brasil nos últimos anos, marcada nesta última eleição presidencial de 2014, mostra a falta de discurso e propostas claras, tanto dos ditos partidos de esquerda como os ditos de direita; "ditos", pois assumem discursos quase próximos, e para sua manutenção ou alavancamento ao poder, fazem alianças políticas nunca antes pensadas em suas origens. O poder é o fim e não o meio, por estes caminhos assumidos. Sem o poder, não se consegue a atuação política, enquanto as ideias, propostas, projetos ficam para depois do poder. Manipula-se a população por todos os lados e matizes políticos para manutenção política; incute-se na vaidade pessoal de cada um, o seu papel de cidadão. Levantar a bandeira do Brasil, gritar palavras de ordem, pintar a cara e pedir mudanças na política, no governo, no governante, no regime político não é mais coisa de direita ou esquerda. É coisa do próximo Twitter! Ou grupo do Whatsapp, Facebook [...] As atuais manifestações de rua são eventos meramente sociais, uma forma de ocupar o espaço público tão distante do dia a dia e tão diferente e incomum da vida on-line comum. Mas o alcance político vai depender da vontade da política...

A jovem democracia brasileira, como já apontaram alguns, ainda não aprendeu a votar e não aprendeu com a história e seus erros. Tiram-se e colocam-se governantes pelo voto, mas esquecem do poder do voto na hora do voto. E os partidos jogam a história pelo ralo para reinventar a mesma, moldá-la ao seu poder. A esquerda parou no tempo; é verdade que em um tempo em que ainda havia discurso, mas, não aprendeu a reinventar seus discursos (ao invés da história), suas propostas para a sociedade que muda a passos largos. A direita, pelo contrário, nunca precisou mudar, pois sempre será a oposição estática em sua origem. A população, sem muitas opções, vota no "menos pior" ou na loteria para ver o que dá. O debate político se resume a ataques pessoais que dão mais mídia do que um chato fórum de ideias.No final, vamos para a rua no domingo, porque é dia sagrado do descanso e do lazer!         




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